
Por Rajesh Kumar Singh e Doyinsola Oladipo
CHICAGO/NOVA YORK, 10 Out (Reuters) - Os problemas financeiros da Spirit Airlines revelam que a ascensão no segmento de luxo não é uma panaceia para os desafios enfrentados pelas companhias aéreas de baixo custo, que estão lidando com custos operacionais crescentes, mudanças nas preferências dos clientes e forte concorrência das três grandes companhias aéreas dos EUA.
Depois de sair da recuperação judicial em março, a Spirit tentou mudar sua marca (link) e focar em viajantes mais abastados para recuperar seus negócios. Mas, em seis meses, a companhia aérea com sede na Flórida entrou com pedido de falência novamente (link), ressaltando os limites de uma estratégia que está sendo replicada no setor de baixo custo com resultados igualmente mistos.
O aumento pós-pandemia nos salários, nos custos de arrendamento de aeronaves e em outras despesas operacionais corroeu a vantagem de custos (link) com as quais as companhias aéreas de baixo custo contavam antigamente. Ao mesmo tempo, a inflação atingiu com mais força a sua base de clientes principal (link), enquanto as Três Grandes - Delta DAL.N, United UAL.O e American AAL.O - implantaram aeronaves maiores (link) e ofertas econômicas básicas expandidas para competir diretamente por viajantes sensíveis a preços.
O resultado é uma pressão de ambos os lados: aumento de custos e redução da participação de mercado.
MARGENS SOB PRESSÃO
A mudança estratégica da Spirit teve como objetivo atender à crescente demanda por viagens premium e construir um fluxo de receita com alta margem para compensar o aumento dos custos. A Frontier Airlines ULCC.O, sua concorrente mais próxima, seguiu o exemplo, adicionando assentos de primeira classe (link) e expandindo as vantagens de fidelidade (link). A Breeze Airways, fundada pelo veterano da JetBlue JBLU.O David Neeleman, também oferece comodidades combinadas e assentos maiores a preços mais baixos do que as companhias aéreas tradicionais.
Mas a receita trimestral da Spirit caiu 20% em meio a uma queda acentuada no volume de passageiros, enquanto os custos operacionais não relacionados a combustível dispararam. A companhia aérea registrou um prejuízo de US$ 246 milhões no trimestre de junho. A Frontier teve prejuízo de US$ 70 milhões.
As despesas operacionais da Spirit no trimestre encerrado em junho totalizaram 118% da receita, acima dos 84% registrados em 2019. As despesas da Frontier atingiram 108%, um aumento de 24 pontos percentuais em relação ao período anterior à pandemia. As transportadoras de serviço completo também enfrentam pressões de custos, mas seus fluxos de receita diversificados ajudaram a proteger as margens e a superar o desempenho do setor em geral.
Neeleman, presidente-executivo da Breeze Airways, atribuiu os problemas das companhias aéreas de baixo custo à concorrência direta com as tradicionais. Em entrevista, ele afirmou que companhias aéreas menores, como a Breeze e a Allegiant ALGT.O, vêm lucrando, pois operam principalmente em rotas sem escalas, sem concorrência.
AS TRÊS GRANDES SE IMPÕEM
Delta, United e American têm utilizado aeronaves de maior capacidade em rotas domésticas para competir de forma mais eficaz por viajantes com orçamento limitado. Suas tarifas econômicas básicas, antes vistas como uma oferta de nicho, agora representam uma fatia crescente das vendas de passagens.
A classe econômica básica da United representou 15% das vendas domésticas no ano passado, um aumento de 2 pontos em relação a 2023. Seu diretor comercial, Andrew Nocella, chamou a oferta da classe econômica básica de um "golpe certeiro" para a companhia aérea.
"A proliferação da economia básica foi o que realmente prejudicou", disse Neeleman à Reuters.
Em uma audiência no Congresso no mês passado, o presidente-executivo da Frontier, Barry Biffle, acusou as companhias aéreas tradicionais de usar programas de fidelidade para subsidiar tarifas econômicas básicas e pediu aos parlamentares que removessem as barreiras que impedem as companhias aéreas de baixo custo de competir em pé de igualdade.
"Muitos portões estão trancados e muitas portas estão fechadas", disse ele.
O PIVÔ PREMIUM ARRUÍNA A SIMPLICIDADE DE BAIXO CUSTO
O modelo de tarifas escalonadas da Spirit agora inclui embarque prioritário, lanches e bebidas de cortesia, Wi-Fi para streaming e despacho gratuito de bagagem — recursos antes impensáveis para uma transportadora conhecida por seu serviço básico. A Frontier também atualizou suas ofertas e simplificou o atendimento ao cliente.
Mas analistas afirmam que a mudança acrescenta complexidade operacional e dilui a simplicidade que tornou as companhias aéreas de baixo custo viáveis. Suas ofertas premium também são insignificantes em comparação com as das companhias aéreas tradicionais.
"Você viu em algum lugar um exemplo de uma companhia aérea que tentou se reposicionar na cadeia de valor e conseguiu sobreviver?", disse John Grant, analista sênior da consultoria de viagens OAG.
A Spirit e a Frontier recusaram pedidos de entrevista para esta matéria.
A PERCEPÇÃO DA MARCA AINDA É UM ENTRAVE
As companhias aéreas de baixo custo também enfrentam um desafio complexo de branding ao cortejar viajantes de alto valor, pois construíram uma reputação de 'cobrar por cada mínimo extra' dos clientes.
A Spirit e a Frontier ficaram em último lugar na pesquisa de satisfação do cliente da JD Power deste ano. Um relatório do Senado dos EUA (link) descobriu que ambas as companhias aéreas pagaram US$ 26 milhões em incentivos aos funcionários entre 2022 e 2023 para aplicar políticas de bagagem.
"A única razão pela qual as pessoas estão comprando é porque elas estão basicamente recortando cupons", disse Michael Taylor, diretor administrativo sênior da JD Power.
Ambas as companhias aéreas tomaram medidas para suavizar sua imagem. A Spirit e a Frontier eliminaram as taxas padrão de alteração e cancelamento em muitas tarifas. A Frontier estendeu a validade dos créditos de voo, simplificou o embarque e restabeleceu o suporte por telefone para membros elite do programa de fidelidade.
Ainda assim, alguns viajantes continuam reticentes. Lesly Simmons, profissional de marketing de tecnologia de San Francisco, disse que pagou duas vezes por uma mala despachada em um voo da Frontier e nunca recebeu reembolso.
"Eu não conseguia imaginar por que eu trocaria uma companhia aérea estabelecida que me tratou tão bem ao longo dos anos por uma que não o fez", disse Simmons, que voa frequentemente com a United.