
Por Howard Schneider
WASHINGTON, 3 Nov (Reuters) - A longevidade do consumidor norte-americano como suporte para a economia pode ser testada nas próximas semanas, já que os orçamentos familiares, especialmente entre os de menor renda, estão pressionados pelo aumento dos custos de saúde, pela possível perda de benefícios federais de alimentação e por uma perspectiva instável do mercado de trabalho que já está afetando os ganhos.
Em geral, novembro é o início de uma temporada de compras e viagens animada, com o feriado de Ação de Graças no final do mês e o Natal em dezembro.
Este ano também coincide com a possível perda de benefícios alimentares para muitas famílias em meio à paralisação contínua do governo dos EUA e com o aumento dos custos de saúde para outros, caso os subsídios federais sejam cortados no início do ano para os seguros oferecidos pela Lei de Cuidados Acessíveis, também conhecida como Obamacare.
Acrescente a perda de gastos de centenas de milhares de trabalhadores federais em licença, uma série de anúncios de demissões de grandes empresas, o aumento dos preços e uma recente queda na confiança do consumidor, e a resistência dos compradores dos EUA poderá ser testada.
"A economia norte-americana é uma fera dinâmica e resistente de US$30 trilhões, mas enfrentará um teste na virada do ano", disse Joseph Brusuelas, economista-chefe da RSM US, com "choques adversos de políticas vindos de Washington e a mudança de comportamento entre as empresas que acumularam mão de obra nos últimos quatro ou cinco anos. Esse nunca foi um comportamento indefinido. Veremos uma migração para cima na taxa de desemprego".
Os próximos choques nos orçamentos das famílias ocorrerão em um cenário de desemprego ainda baixo e gastos do consumidor que, pelo menos em agosto, estavam crescendo a uma taxa anual de 2,7%, mais lenta do que no ano passado mas ainda em expansão.
Por enquanto, no entanto, as autoridades do Federal Reserve e de outros órgãos não terão relatórios atualizados do governo para entender como a economia está se adaptando em um momento crítico, já que a paralisação não apenas interrompe os benefícios, mas também o fluxo de dados.
O financiamento dos benefícios do Programa de Assistência Nutricional Suplementar para cerca de 42 milhões de pessoas de baixa renda, quase 12% da população dos EUA, deveria acabar em 1º de novembro devido à paralisação, que já está em seu segundo mês.
Um juiz federal em Rhode Island, no entanto, decidiu na sexta-feira que a suspensão dos benefícios era ilegal, e não estava claro se alguns deles seriam pagos este mês.
A perda do benefício "imporia dificuldades significativas a muitas famílias, mas o impacto sobre os gastos gerais dos consumidores e o PIB provavelmente será relativamente pequeno", cerca de US$100 bilhões por ano, disse Samuel Tombs, economista-chefe da Pantheon Macroeconomics nos EUA. Entretanto, esse é "apenas um canal pelo qual a paralisação pesará sobre a atividade neste trimestre".
Em sua ausência, pelo menos uma dúzia de Estados tem planos para preencher parte da lacuna dos benefícios alimentares, mas os valores envolvidos são uma fração do que o programa fornece a cada mês, e alguns Estados grandes, incluindo o Texas e a Flórida, não anunciaram nenhum esforço para intervir.
ECONOMIA
Economistas não veem necessariamente a economia entrando em recessão como resultado das crescentes pressões sobre os consumidores, embora Brusuelas tenha estimado que a paralisação possa reduzir o crescimento do quarto trimestre em um ponto percentual, chegando a 1%.
Assim como a atual paralisação pode afetar os orçamentos familiares antes da temporada de pico de compras, forças compensatórias, incluindo cortes de impostos e isenções para coisas como pagamento de horas extras e renda de gorjetas, aumentarão muitas restituições familiares no próximo ano.
"No primeiro trimestre do ano, veremos restituições de impostos substanciais para os trabalhadores norte-americanos", disse recentemente o secretário do Tesouro, Scott Bessent, à Fox Business Network, algo que também permitirá que alguns contribuintes retenham menos e fiquem com mais de seus pagamentos semanais.
No entanto, ainda não se sabe como isso tudo vai se desenrolar e será observado de perto pelas autoridades do Fed, que tentam entender se a economia vai desacelerar e o desemprego aumentar ou se vai acelerar à medida que as empresas e as famílias terminarem de se ajustar ao comércio, à imigração e a outras mudanças de políticas durante o primeiro ano do segundo mandato do presidente Donald Trump na Casa Branca.
O chair do Fed, Jerome Powell, falando a repórteres depois que o banco central cortou a taxa de juros em 0,25 ponto percentual na semana passada, observou como os gastos dos consumidores "desafiaram muitas previsões negativas" e ajudaram a sustentar o crescimento econômico.
Mas ele também observou, assim como outros no Fed, o atual padrão "bifurcado" - às vezes chamado de "economia em forma de K" - de famílias de renda mais alta aproveitando os ganhos do mercado de ações e gastando livremente em viagens, produtos de alta qualidade e refeições em restaurantes, em contraste com sinais de estresse, incluindo o aumento da inadimplência nos financiamentos de automóveis e intensas compras de pechinchas no resto do país.
"Há tantas informações anedóticas sobre isso que achamos que há alguma coisa", disse Powell.
Enquanto isso, as rodadas de demissões anunciadas pela Amazon.com, UPS e outras "podem ter implicações absolutas para a criação de empregos", que alguns economistas já consideram paralisada, acrescentou Powell.
Os ventos contrários estão prestes a se tornar mais fortes.
Além da ameaça aos pagamentos do auxílio-alimentação, os orçamentos das famílias podem sofrer outro golpe com os prêmios mais altos dos planos de saúde adquiridos de acordo com o Obamacare. O vencimento, no próximo ano, dos créditos fiscais para financiar esses seguros é uma questão central no impasse orçamentário entre Trump, cujo projeto de lei fiscal no início deste ano cortou os subsídios do programa, e os democratas no Congresso, que querem mantê-los.
A Kaiser Family Foundation estimou que a perda dos créditos fiscais custará aos mais de 20 milhões de pessoas seguradas pelo Obamacare mais de US$1.000 por ano, em média, e potencialmente mais.
Uma pesquisa do JPMorganChase Institute aponta para outro risco. A análise de seu banco de dados interno de correntistas mostrou que o crescimento da renda ajustado pela inflação entre as pessoas com idade entre 25 e 54 anos, um importante grupo demográfico de consumidores, caiu de cerca de 3% ao ano para 2%, no mesmo nível da taxa lenta após a crise financeira e recessão de 2007-2009.
Com a proximidade das festas de fim de ano, há motivos para se preocupar com o consumidor, disseram economistas da Yardeni Research. Juntamente com todos os outros problemas, pesquisas recentes mostram que as pessoas estão planejando gastar menos durante a temporada de compras de Natal e, além disso, haverá menos pessoas gastando devido às recentes deportações de imigrantes e à fiscalização mais rigorosa da imigração.
"Haverá literalmente menos pessoas comprando nos EUA nesta temporada de festas, e as que estão comprando dizem que gastarão menos nesta temporada", disse Jackie Doherty, editora colaboradora do Yardeni.
(Reportagem adicional de Ann Saphir)
((Tradução Redação São Paulo))
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