Por Elizabeth Piper e Ludwig Burger e Lili Bayer
LONDRES/BERLIM/BRUXELAS, 24 Set (Reuters) - Os comentários do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apoiando Kiev em sua missão para recuperar todo seu território da Rússia provocaram uma mistura de alívio e suspeita de que o líder norte-americano esteja pronto para deixar a Europa mais à própria sorte no apoio aos ucranianos.
Os comentários de Trump na rede Truth Social marcaram uma mudança retórica abrupta e importante para ele, que anteriormente havia incentivado a Ucrânia a ceder território para acabar com a guerra e estendido o tapete vermelho para Vladimir Putin no Alasca, no mês passado.
Mas não ficou imediatamente claro se Trump apoiaria suas palavras com uma mudança na política dos EUA, uma ambiguidade que poderia manter a responsabilidade sobre a Europa de atender mais às necessidades da Ucrânia por meio de armas e financiamento, à medida que o papel de Washington diminui.
"Acho que as pessoas estão se animando porque isso sugere... que sua compreensão do conflito mudou", disse à Reuters Neil Melvin, diretor de Segurança Internacional da RUSI, sobre os comentários de Trump.
"Ele reconheceu que o conflito é mais complicado e está claramente frustrado com Putin. Então acho que talvez seja um sucesso para a diplomacia ucraniana e europeia que essa explicação tenha sido aceita."
No entanto, Trump está mantendo uma ambiguidade estratégica em torno do conflito, encorajando a Ucrânia sem comprometer o apoio dos EUA, disse Melvin.
"Então, a narrativa em torno do que ele está dizendo mudou, mas ele ainda parece estar falando sobre distanciar os EUA da liderança do conflito. Ele está sempre jogando a culpa de volta para a Europa."
AUMENTAR RITMO NÃO SERÁ FÁCIL PARA A EUROPA
O ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Johann Wadephul, recebeu bem os comentários de Trump, mas disse que era hora de a Europa intervir.
"Podemos conseguir muito mais; nem todos os estados europeus cumpriram o que prometeram à Ucrânia", disse Wadephul à rádio alemã Deutschlandfunk.
"Temos que analisar quais outras opções financeiras e militares temos", afirmou, acrescentando que não seria fácil para a Europa aumentar seus esforços de segurança.
Duas autoridades, falando à Reuters sob condição de anonimato, também alertaram que Trump pode estar sinalizando que cabe à Europa ajudar a Ucrânia agora.
"Parece que ele está se despedindo, não é? Mas isso pode mudar amanhã. De qualquer forma: as cartas estão claras para nós. Sabemos o que devemos fazer", disse uma autoridade da Europa Ocidental.
Um diplomata sênior do Leste Europeu disse que os comentários de Trump sobre a Ucrânia tinham como objetivo mostrar "que ele está começando a se desligar, enviando uma mensagem de que a questão é da Europa".
As ações de defesa europeias subiram no pregão da manhã desta quarta-feira após os comentários de Trump, mas os títulos internacionais da Ucrânia caíram.
Viktor Szabo, gerente de portfólio da Aberdeen Investments, que investe em títulos ucranianos, disse que quaisquer comentários de Trump devem ser tratados com ceticismo. Segundo ele, os spreads de títulos ainda apontam para um otimismo decrescente sobre as perspectivas econômicas da Ucrânia.
"Há claramente uma vontade da União Europeia de aumentar o apoio", disse. "Mas não há vontade da Rússia -- e eles são os agressores."
EUROPA JÁ ASSUME PAPEL MAIS IMPORTANTE
Antes de retornar à Casa Branca, em janeiro, Trump se gabava de ser capaz de encerrar a guerra na Ucrânia em 24 horas se fosse reeleito. Após uma reunião desastrosa do norte-americano com o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskiy no Salão Oval, em fevereiro, líderes europeus têm se esforçado para trazer Trump para seu lado.
Eles também tentaram convencê-lo de que Moscou é a única responsável pela guerra, que começou com a invasão em larga escala da Ucrânia pela Rússia, em 24 de fevereiro de 2022.
"Trump está se dando conta de que Putin o está enganando", disse à Reuters Jaroslava Barbieri, pesquisadora do Fórum Ucrânia da Chatham House.
"Acho que Trump também está procurando uma saída para manter essa imagem de mediador de paz eficaz, tentando jogar a culpa na Rússia e nos europeus... então, se houver um fracasso contínuo em pôr fim à guerra na Ucrânia, não é por causa dele."
Os EUA são há muito tempo o maior financiador e fornecedor de armas à Ucrânia, mas desde que Trump assumiu o poder, ele insiste que a Europa assuma uma parcela muito maior da responsabilidade em termos de defesa. Até certo ponto, isso já aconteceu.
Os membros europeus da aliança da Otan aumentaram seus gastos militares e também forneceram defesas aéreas à Ucrânia.
Apesar dos esforços europeus, disse Melvin, a retórica de Trump pode mudar novamente.
"Acho que estamos sempre a apenas um telefonema de Putin de distância de uma mudança, e é por isso que acho que, fundamentalmente, os primeiros oito meses corroeram a confiança da Europa na abordagem do governo Trump, e isso não restaura a confiança."
(Reportagem de Elizabeth Piper, Ludwig Burger, Lili Bayer, Alexander Ratz, Karin Strohecker; texto de Matthias Williams)
((Tradução Redação São Paulo))
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