Por Dawn Chmielewski e Jonathan Allen
18 Set (Reuters) - O presidente dos EUA, Donald Trump, comemorou nesta quinta-feira a suspensão do apresentador de talk-show Jimmy Kimmel da televisão, inflamando um debate sobre se Trump e os republicanos estão infringindo a liberdade de expressão ao tentar punir alguns críticos do ativista de direita assassinado Charlie Kirk.
Trump, falando durante uma visita de Estado ao Reino Unido, disse que Kimmel havia sido punido por "dizer coisas horríveis" sobre Kirk, um aliado político próximo do presidente, a quem se atribui a construção do apoio a Trump entre os jovens eleitores conservadores. A emissora ABC anunciou na noite de quarta-feira que estava retirando o programa "Jimmy Kimmel Live" por tempo indeterminado.
Desde que retornou à Casa Branca em janeiro, Trump tem procurado cada vez mais usar seu gabinete e os tribunais para atacar discursos críticos contra ele que ele considera difamatórios ou falsos.
A suspensão de Kimmel ocorreu depois que pelo menos dois grandes proprietários de estações de TV locais disseram que substituiriam o programa noturno repleto de celebridades, e o principal órgão regulador de comunicações do país ameaçou investigar os comentários de Kimmel sobre Kirk.
Kimmel, um comediante que frequentemente ridiculariza Trump, disse durante seu monólogo de abertura de nove minutos na segunda-feira que os aliados de Kirk estavam usando seu assassinato na semana passada para "marcar pontos políticos". Kirk, 31 anos, foi baleado enquanto debatia com estudantes em uma universidade em Utah, em 10 de setembro, em um evento organizado por seu grupo de política estudantil, o Turning Point USA.
"No fim de semana, chegamos a novos patamares com a gangue MAGA tentando desesperadamente caracterizar o garoto que assassinou Charlie Kirk como qualquer coisa que não seja um deles, e fazendo tudo o que podem para ganhar pontos políticos com isso", disse Kimmel. MAGA é uma abreviação do slogan de Trump: "Make America Great Again" (fazer os EUA grandes novamente).
Kimmel também zombou das respostas de Trump à morte de Kirk: "Não é assim que um adulto lamenta o assassinato de alguém que ele chamava de amigo. É assim que uma criança de quatro anos lamenta um peixinho dourado".
Trump disse em uma coletiva de imprensa nesta quinta-feira que Kimmel não era talentoso, tinha índices de audiência ruins e "disse uma coisa horrível sobre um grande cavalheiro conhecido como Charlie Kirk".
"Então, você sabe, você pode chamar isso de liberdade de expressão ou não", disse Trump enquanto estava ao lado do primeiro-ministro britânico, Keir Starmer. "Ele foi demitido por falta de talento." A ABC não disse que demitiu Kimmel, que não respondeu a um pedido de comentário.
Na semana que se seguiu ao assassinato de Kirk, Kimmel é o norte-americano mais famoso a sofrer reações profissionais por ter feito comentários vistos pelos conservadores como ofensivos a Kirk, ao lado de figuras da mídia, acadêmicos, professores e funcionários de empresas.
Um estudante de faculdade técnica de 22 anos e entusiasta de videogames de Utah foi acusado do assassinato de Kirk na terça-feira.
Democratas proeminentes disseram que Trump e seu Partido Republicano estavam montando um ataque aos direitos de liberdade de expressão garantidos na Primeira Emenda da Constituição dos EUA. Os republicanos disseram que estão lutando contra o "discurso de ódio" que pode levar à violência.
O ex-presidente dos EUA Barack Obama, que foi sucedido por Trump em 2017, disse que as empresas de mídia não devem capitular à coerção do governo, violando os direitos de liberdade de expressão da Primeira Emenda da Constituição dos EUA.
"Após anos de reclamações sobre a cultura do cancelamento, o atual governo a levou a um nível novo e perigoso ao ameaçar rotineiramente com ações regulatórias contra as empresas de mídia, a menos que elas amordaçam ou demitam repórteres e comentaristas que não lhe agradam", disse Obama em um comunicado.
Os sindicatos dos roteiristas e atores disseram que a medida representa um ataque à Primeira Emenda e ao direito de discordar.
"Que vergonha para aqueles no governo que se esquecem dessa verdade fundamental", disse o Sindicato dos Roteiristas da América em um comunicado. "Quanto aos nossos empregadores, nossas palavras os enriqueceram. Silenciar-nos empobrece o mundo inteiro."
LIBERDADE DE EXPRESSÃO, INTERESSE PÚBLICO
A morte de Kirk provocou uma onda de tristeza entre os fãs e alguns críticos, que o viam como um defensor ferrenho do debate público e dos valores conservadores. Outros ridicularizaram o apoio de Kirk à política de direita e ao nacionalismo cristão e os comentários depreciativos que ele fez sobre imigrantes, negros, esquerdistas e transgêneros.
Muito antes do assassinato de Kirk, Trump ameaçou repetidamente retirar as licenças das estações de televisão e pressionou as emissoras para que parassem de transmitir conteúdo que ele considera questionável. Ele também direcionou sua ira para a mídia impressa com a apresentação de um processo de difamação de US$15 bilhões contra o New York Times.
Horas antes da suspensão de Kimmel, Brendan Carr, presidente da Comissão Federal de Comunicações (FCC), pediu às emissoras locais que parassem de transmitir o programa.
A ABC, de propriedade da Walt Disney DIS.N, retirou o programa depois que a Nexstar, proprietária de 32 afiliadas locais da ABC, disse que deixaria de transmitir o programa após o monólogo de Kimmel. O Sinclair Broadcast Group, outro grande proprietário de estações de TV locais, também emitiu um comunicado informando que estava suspendendo as transmissões do programa até que Kimmel pedisse desculpas à família Kirk.
"Este é um momento muito significativo, porque as emissoras locais estão agora pressionando os programadores nacionais pela primeira vez que me lembro na história moderna", disse Carr, presidente da FCC, em entrevista à CNBC. Ele disse que a FCC defenderia o princípio de que as emissoras licenciadas devem agir de acordo com o "interesse público".
Não está claro quais recursos legais Kimmel poderá buscar. Ele poderia processar a ABC e a FCC por violar seu direito constitucional à liberdade de expressão, mas provavelmente enfrentaria um alto grau de dificuldade para provar essas alegações. A Constituição dos EUA protege o discurso, inclusive o que às vezes é chamado de "discurso de ódio", mas somente contra ações ou coerção "tangível" do governo, de acordo com o precedente da Suprema Corte dos EUA.
(Reportagem de Dawn Chmielewski em Los Angeles e Jonathan Allen em Nova York; reportagem adicional de Steve Holland em Chequers, Inglaterra, Dave Shepardson e Trevor Hunnicutt em Washington e Lisa Richwine em Los Angeles)
((Tradução Redação São Paulo))
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