
Por John Kruzel
WASHINGTON, 6 Nov (Reuters) - Depois que a Suprema Corte dos Estados Unidos utilizou um princípio jurídico conservador chamado doutrina das "questões importantes" para fragilizar a agenda do ex-presidente democrata Joe Biden, será que as tarifas abrangentes do presidente republicano Donald Trump terão o mesmo destino?
Essa é uma questão fundamental, conforme o tribunal decide a legalidade das tarifas, que são fundamentais para a política econômica de Trump e como ele lida com o resto do mundo. O tribunal ouviu os argumentos no caso na quarta-feira, e a doutrina foi um ponto focal, conforme juízes questionaram os advogados que representam o governo Trump e as partes que contestaram as tarifas como um exagero do poder presidencial.
O tribunal tem uma maioria conservadora de 6 a 3. Nos últimos anos, seus juízes conservadores adotaram essa doutrina, que exige que as ações do Poder Executivo de "grande importância econômica e política" sejam claramente autorizadas pelo Congresso.
POLÍTICAS DE BIDEN
O tribunal citou a doutrina para impedir o plano de Biden de cancelar US$430 bilhões em dívidas estudantis, bloquear seu mandato de vacinação ou teste de Covid-19 para grandes empresas, desfazer sua política de proteger locatários sem dinheiro contra despejo durante a pandemia e reverter a autoridade da Agência de Proteção Ambiental para regular a poluição de carbono das usinas de energia.
No caso das tarifas, ainda não se sabe como o tribunal decidirá e se a doutrina orientará sua decisão. Mas a maioria dos juízes sinalizou pelo menos algumas preocupações com a legalidade da imposição das tarifas por Trump de acordo com uma lei de 1977 destinada a ser usada em emergências nacionais.
O Congresso aprovou a Lei de Poderes Econômicos Emergenciais Internacionais, ou IEEPA, para aumentar os poderes do presidente durante uma emergência nacional. Embora a medida autorize o presidente a regular a importação, ela não contém a palavra tarifa. Antes de Trump, nenhum presidente havia usado a IEEPA para impor tarifas.
O procurador-geral dos EUA, D. John Sauer, representante do governo Trump, enfrentou resistência quando sugeriu, durante a argumentação, que a doutrina das grandes questões não deveria se aplicar às tarifas de Trump, citando a autoridade presidencial no âmbito das relações exteriores.
"Quero dizer, parece que ela pode ser diretamente aplicável", disse o presidente da Suprema Corte, o conservador John Roberts, a Sauer, referindo-se à doutrina.
"A justificativa está sendo usada para um poder de impor tarifas sobre qualquer produto, de qualquer país, em qualquer quantidade, por qualquer período de tempo", acrescentou Roberts. "Não estou sugerindo que ela não exista, mas parece que essa é uma grande autoridade, e a base para essa alegação parece ser inadequada."
"UM CONSTRANGIMENTO"
O tribunal corre o risco de parecer profundamente partidário caso se recuse a examinar as tarifas de Trump com base nessa doutrina, de acordo com Corey Brettschneider, professor da Brown University que ministra cursos de direito constitucional.
"Eles a usaram para restringir Biden, então por que não a usariam aqui?", perguntou Brettschneider. "Isso seria um constrangimento para o tribunal."
Entre os seis juízes conservadores, Roberts parecia ser o mais claramente inclinado a decidir contra as tarifas de Trump com base na doutrina das questões importantes. Os juízes conservadores Neil Gorsuch e Amy Coney Barrett, juntamente com os três membros liberais do tribunal, também pareceram duvidar da solidez jurídica das tarifas de Trump.
O professor da Faculdade de Direito de Albany Raymond Brescia disse que a ambiguidade em torno do escopo da IEEPA deve levar o tribunal a aplicar a doutrina das grandes questões, assim como fez no caso do empréstimo estudantil de Biden, e derrubar as tarifas de Trump.
"O fato de ser difícil dizer se o tribunal vai mesmo aderir às suas decisões anteriores diz muito sobre o que muitos observadores do tribunal pensam sobre se alguém deve apostar contra o governo Trump perante este tribunal", disse Brescia.
((Tradução Redação Brasília))
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