Por Ana Mano e Roberto Samora e Lisandra Paraguassu
SÃO PAULO/BRASÍLIA, 16 Mai (Reuters) - O Brasil, maior exportador de carne de frango do mundo, detectou pela primeira vez o vírus da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP) em uma granja comercial, levando a restrições por parte de importadores, incluindo a China, o principal comprador no ano passado.
O foco foi registrado no município de Montenegro, no Rio Grande do Sul, em uma granja para produção de ovos para recria de aves. A unidade é fornecedora da Vibra Foods, uma empresa brasileira que tem parceria com a Tyson Foods TSN.N, de acordo com duas pessoas familiarizadas com o assunto.
A Vibra e a Tyson não responderam imediatamente a perguntas sobre o assunto. A Vibra possui 15 unidades de processamento no Brasil e exporta para mais de 60 países, de acordo com o site da empresa.
As exportações brasileiras de carne de frango somaram US$10 bilhões em 2024, ou mais de 5 milhões de toneladas, respondendo por cerca de 35% do comércio global, com grande parte das vendas realizadas por BRF BRFS3.SA e JBS JBSS3.SA, que exportam para cerca de 150 países.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que medidas de contenção da gripe aviária foram adotadas para isolar o foco, acrescentando que ainda é prematuro calcular os prejuízos decorrentes dos embargos internacionais.
"Já está isolado, já está sendo feita a higienização sanitária. Anunciamos para os nossos parceiros do mundo, decretamos estado de emergência zoosanitária por 60 dias, e com a robustez do nosso sistema há certeza de que rapidamente vamos voltar ao estado de normalidade", afirmou o ministro a jornalistas.
Segundo Fávaro, 35 aves inicialmente tiveram o vírus na granja.
"Ele (o vírus) é bastante agressivo, rapidamente começa a ter outras mortes. Foi feito total extermínio, o bloqueio, que é o mais importante, para que a gente possa conter o foco rapidamente", explicou.
Embora seja mortal para as aves, a doença não é transmitida pelo consumo de carne de aves ou de ovos, afirmou o Ministério da Agricultura e Pecuária em nota, buscando tranquilizar a população.
O risco de infecções em humanos pelo vírus da gripe aviária é baixo, acrescentou. Mas, por questões sanitárias, alguns países suspendem as compras, seja totalmente ou apenas da região afetada, dependendo do acordo.
No caso da China, que comprou mais de 10% da carne de frango brasileira exportada em 2024, segundo dados do setor, o Brasil ainda não tem um acordo, e as exportações para o país asiático estão automaticamente suspensas pelo protocolo.
"A China, infelizmente, é todo o país, o status de emergência é de 60 dias", afirmou o ministro, acrescentando ter esperanças de uma retomada mais breve, caso o foco seja contido.
Mais tarde, em entrevista à Reuters, Fávaro também citou Coreia do Sul e União Europeia como outros destinos que preveem um embargo total. Fávaro disse, no entanto, que nenhum país havia formalmente confirmado os embargos ao ministério até o meio desta sexta.
No meio da tarde, a agência sanitária da Argentina ordenou suspensão das importações de produtos e subprodutos de aves do Brasil.
Por outro lado, Fávaro afirmou que o Brasil tem acordos com Japão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita para restringir o embargo a exportações apenas ao Estado atingido, com a restrição posteriormente se limitando ao município.
Os Emirados Árabes Unidos se colocaram como o segundo principal destino da carne de frango do Brasil em 2024, comprando 8,8% do total exportado, enquanto o Japão foi o terceiro (5,6%), seguido pela Arábia Saudita (7%). A União Europeia apareceu como o sétimo principal destino do produto brasileiro no ano passado, enquanto a Coreia do Sul foi o décimo.
"Há um mês repactuamos onde fica restrito com o Japão. A partir dessa mudança (no caso do Japão), vai ficar restrito ao Rio Grande do Sul, e na sequência ao município de Montenegro", disse Fávaro.
Apesar do prazo de 60 dias para retomar o mercado da China, o ministro mostrou otimismo de uma resolução mais rápida.
"O foco tem período de 28 dias, a gente conseguindo eliminar todo o foco, rastrear todos, a gente acha que é possível, com muita transparência, estabelecer o fluxo normal com a China antes dos 60 dias."
Em entrevista à GloboNews, ao ser questionado sobre impactos nos preços da carne de frango para o brasileiro, o ministro admitiu que, devido aos embargos internacionais, pode haver maior oferta interna, pressionando os valores do produto vendido aos brasileiros. Ele ponderou, no entanto, que um problema como esse não pode ser comemorado.
"Teremos uma oferta mais abundante e pode pressionar o preço para baixo", disse.
AVES SILVESTRES
Fávaro ressaltou que a grande preocupação sobre embargos está relacionada à eventual detecção de casos em granjas comerciais, o que pelas regras internacionais acaba gerando interrupções de exportações.
Enquanto isso, mortes de aves aquáticas silvestres no zoológico de Sapucaia do Sul (RS) foram causadas por gripe aviária nesta semana, afirmou nesta sexta-feira a coordenadora do Programa Nacional de Sanidade Avícola no Rio Grande do Sul, Tais Oltramari Barnasque, em entrevista a jornalistas.
Questionado sobre o assunto pela Reuters, o ministro da Agricultura disse que isso "é um indício de que o vírus está rondando a região".
Mas ele lembrou que o Brasil já registrou gripe aviária em aves silvestres há dois anos, e que esse tipo de registro não gera embargos de importadores, como pode acontecer quando o foco é em granja comercial.
Após o surto em 2023, ainda sem um protocolo sobre o assunto, o Japão suspendeu as compras de aves do Espírito Santo, onde na época um surto foi confirmado em uma fazenda não comercial.
Segundo o ministério, o Serviço Veterinário brasileiro está treinado e equipado para enfrentar a doença desde a primeira década dos anos 2000.
"No Brasil nós conseguimos segurar muito tempo, foram praticamente 19 anos, e conseguimos não deixar entrar nas granjas comerciais. Há dois anos tivemos caso em aves silvestres", afirmou Fávaro.
As ações adotadas incluem o monitoramento de aves silvestres, a vigilância epidemiológica na avicultura comercial e de subsistência, e o treinamento constante de técnicos, afirmou o ministério.
GRANJAS DOS EUA
A gripe aviária assola a indústria avícola dos EUA desde 2022, matando cerca de 170 milhões de frangos, perus e outras aves, além de afetar gravemente a produção de carne e ovos.
A doença também infectou quase 70 pessoas nos EUA, com uma morte, desde 2024. A maioria dessas infecções ocorreu entre trabalhadores rurais expostos a aves ou vacas infectadas.
"Todas as medidas necessárias para o contingenciamento da situação foram rapidamente adotadas, e a situação está sob controle e monitoramento dos órgãos governamentais", disse em nota a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), que representa os produtores.
Procurada, a JBS encaminhou as perguntas sobre o surto à ABPA.
O CEO da BRF, Miguel Gularte, disse a analistas em teleconferência sobre resultados que estava confiante de que os protocolos sanitários brasileiros eram robustos e que a situação seria superada rapidamente.
(Por Ana Mano, Isabel Teles e Roberto Samora, em São Paulo, e Lisandra Paraguassu, em Brasília; reportagem adicional de Débora Ely, em Porto Alegre)