Por Mario Fuentes e Dave Sherwood
HAVANA, 29 Abr (Reuters) - A mãe cubana Heidy Sánchez caiu em lágrimas ao relembrar o momento, na semana passada, em que as autoridades de imigração dos Estados Unidos na Flórida lhe disseram que ela seria deportada e separada de sua filha de um ano a quem ainda amamentava.
"Eles me disseram para ligar para meu marido, que nossa filha tinha que ficar e que eu iria embora", afirmou ela à Reuters em uma entrevista na casa de um membro da família perto da capital cubana, Havana. "Minha filha ficou nervosa e agitada e começou a pedir leite, mas isso não importava para eles."
O Departamento de Segurança Interna (DHS, na sigla em inglês) dos EUA disse à Reuters que a declaração de Sánchez era imprecisa e contradizia o protocolo padrão do Departamento de Imigração e Alfândega (ICE, na sigla em inglês).
"Os pais são questionados se querem ser removidos com seus filhos ou se o ICE colocará as crianças com alguém indicado pelos pais", declarou a secretária assistente Tricia McLaughlin em uma resposta por email no final da segunda-feira.
"Nesse caso, a mãe declarou que queria ser removida sem a criança e a deixou sob os cuidados de um parente seguro nos Estados Unidos."
O DHS não respondeu imediatamente a um pedido da Reuters por evidências de que foi oferecida a Sánchez a opção de levar sua filha com ela para Cuba.
Sánchez disse que chegou ao seu país de origem horas depois de ser detida, sem passaporte ou identificação e sem documentação dos Estados Unidos explicando o motivo de sua deportação.
As contradições no caso de Sánchez destacam as preocupações entre os defensores dos direitos civis sobre os direitos ao devido processo legal dos imigrantes durante a repressão à imigração do presidente dos EUA, Donald Trump, uma plataforma fundamental de sua campanha eleitoral de 2024.
Na segunda-feira, o governo de Trump elogiou os primeiros resultados das medidas agressivas de fiscalização, destacando uma queda nas travessias ilegais da fronteira.
Democratas e defensores dos direitos civis, entretanto, criticam as táticas de seu governo, incluindo os casos de várias crianças cidadãs americanas recentemente deportadas com seus pais. Uma das crianças tinha uma forma rara de câncer, de acordo com American Civil Liberties Union.
Diferentemente desses casos, Sánchez, que foi surpreendida em um check-in de rotina em um escritório do ICE em Tampa na última quinta-feira, disse que não teve escolha a não ser deixar para trás sua filha, cidadã norte-americana.
Ela afirmou que os funcionários a separaram da filha, a acompanharam até uma van, a algemaram e, mais tarde naquele dia, a deportaram por via aérea para Cuba, juntamente com outras 81 pessoas.
Sánchez, de 44 anos, estava sob ordens de deportação desde 2019, mas tinha permissão para viver e trabalhar temporariamente nos Estados Unidos, desde que se apresentasse regularmente ao ICE.
Durante esse período, ela se casou com um cidadão norte-americano naturalizado cubano e teve seu primeiro filho em novembro de 2023.
Seu marido solicitou residência legal nos EUA para Sánchez há dois anos como resultado de seu casamento, mas ainda não recebeu resposta, segundo ela.
Sánchez se emocionou várias vezes durante a entrevista à Reuters. Ela disse que entendia que os funcionários do ICE estavam "apenas fazendo seu trabalho", mas que separar uma mãe de seu bebê que está amamentando era "injusto".
"Não consigo dormir, não consigo descansar", declarou ela. "Tudo o que peço é que eles me reúnam novamente com minha filha."
O caso ressalta uma forte ruptura na política entre os governos Trump e Biden.
Sob Biden, os funcionários do ICE foram instruídos a considerar o impacto da ação de aplicação da lei sobre as famílias.
Trump rescindiu essa orientação, que havia priorizado as deportações de criminosos graves. Em vez disso, Trump ampliou o escopo da aplicação da lei, inclusive visando imigrantes como Sánchez com ordens de deportação permanentes.
Sánchez, que disse não ter antecedentes criminais, está agora a apenas alguns quilômetros da filha na Flórida, mas um mundo à parte.
O agravamento da escassez de alimentos, combustível e remédios na ilha administrada pelos comunistas, a apenas 145 km de Key West, tornou a vida insuportável para muitos cubanos.
A crise provocou um êxodo recorde de mais de 1 milhão de pessoas da ilha, ou mais de 10% da população, uma situação difícil que Cuba atribui às sanções dos EUA, que contribuem para estrangular uma economia estatal já ineficiente.
Sánchez disse que agora se depara com a decisão "impossível" de ficar longe de sua filha pequena ou levá-la para Cuba em crise. "Todo mundo conhece a situação aqui", afirmou ela.
(Reportagem de Mario Fuentes e Dave Sherwood em Havana; reportagem adicional de Ted Hesson em Washington)
((Tradução Redação São Paulo))
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